segunda-feira, 22 de junho de 2009

EXAMES: DE MAL A PIOR

Trancrevemos o parecer da Sociedade Portuguesa de Matemática sobre o exame realizado hoje de Matemática do 9º ano de escolaridade:

Parecer da Sociedade Portuguesa de Matemática sobre o Exame Nacional do 3º ciclo do Ensino Básico (Código 23)

1. Após análise ao Exame do 9º ano hoje efectuado, a SPM verifica que o nível geral da prova é de novo demasiado elementar. O exame destina-se a alunos no final da escolaridade obrigatória. Após nove anos de ensino de matemática exigir-se-ia um maior grau de dificuldade.

2. Logo na pergunta 1, pede-se a média aritmética de três números: 382, 523 e 508. A facilitar ainda os cálculos, que são triviais na posse da calculadora permitida nesta prova, fornece-se a soma (1413) — é uma questão do 6.º ano de escolaridade. Na pergunta 5, pede-se ao aluno que leia valores num gráfico simples. Após leitura desses dados pede-se que calcule o valor de 100 euros em libras, sendo sabido quantas libras vale um euro. A pergunta 6 está ao nível do 3.º ano de escolaridade. Na pergunta 7, pede-se para identificar um sistema de duas equações a duas incógnitas que nem se pede para resolver.

3. Em quase todas as perguntas, os conceitos são testados com exemplos demasiado elementares. Os cálculos são todos muito simples, a equação do segundo grau é trivial, para mais sendo fornecida a fórmula resolvente, e os exemplos de geometria são demasiado directos.

4. Não há problema algum em introduzir num exame perguntas de anos anteriores ou de grau de dificuldade baixo. O que é prejudicial é que um número exagerado de perguntas corresponda a tópicos que deveriam estar sabidos anos antes e que todas ou quase todas as perguntas tenham um grau de dificuldade muito baixo.

5. Grande parte da matéria essencial do 9.º ano de escolaridade não foi coberta por esta prova. É o caso da resolução de inequações, sistemas e equações literais, multiplicação de polinómios, intervalos de números reais, proporcionalidade inversa e igualdade ou semelhança de triângulos.

6. Tanto professores como alunos que se empenharam durante estes anos lectivos sentem-se desacompanhados e desapoiados com esta prova. O que exames deste tipo transmitem é a ideia de que não vale a pena estudar mais do que as partes triviais das matérias. Tanto os jovens que prosseguem os seus estudos no Secundário como os que terminam aqui a sua escolaridade não podem concluir estar bem preparados pelo facto de conseguirem um resultado satisfatório neste exame.

7. Pode pensar-se que provas elementares têm a vantagem de ajudar a perceber que as questões matemáticas não são intransponíveis. Mas estabelecer patamares demasiado baixos, em vez de incentivar a mais estudo e mais conhecimento, acaba por prejudicar todos — tanto os melhores, que se sentem desincentivados, como os menos treinados, que sentem menos necessidade de trabalhar para aumentar o seu domínio das matérias. Em suma, uma prova demasiado elementar como esta não serve o progresso do ensino. Pelo contrário, cria precedentes difíceis de contrariar.

8. A matemática é uma das matérias mais importantes para a formação dos nossos técnicos e dos cidadãos do futuro. Estamos no século XXI. É urgente formar técnicos competentes, capazes de competir num mercado internacionalizado e numa economia em que o conhecimento tem uma importância cada vez maior.

O Gabinete do Ensino Básico e Secundário da Sociedade Portuguesa de Matemática

13 comentários:

Fartinho da Silva disse...

E assim vamos empobrecendo alegremente até... um dia!

Como dizia o outro, é a vida...

joão boaventura disse...

O Ministério da Educação, com o facilitismo, quis provar que todos os instrumentos artificiais agressivos com que conseguiu perturbar o ambiente escolar, afinal, não introduziu desassossego nenhum, pelo que não havia necessidade de tantas manifestações.

E com este artifício demonstrar que os professores até renderam mais ainda, como resposta às exigências ministeriais

Sara Raposo disse...

O que atrás foi dito é, infelizmente, verdadeiro.

Falo como mãe de um aluno do 9º ano que hoje quando acabou a prova me perguntou: afinal para que me serviu estudar para o exame, se o que saiu era tudo "básico" e sobre a matéria mais difícil não foi colocada uma única questão?

Acrescentou ainda: Acho que, com um exame destes, nos estão a tratar como se fossemos "atrasados mentais".

Mal sabe o meu filho de catorze anos como a sua análise é certeira.

Caminhamos para o desastre. A verdade é que os conhecimentos matemáticos que é necessário dominar para aprender o programa do 10º ano continuam a ser os mesmos. O facto dos políticos terem decidido dizer aos jovens portugueses do 9º ano que não tem de se esforçar muito e que as matérias mais difíceis não têm de ser compreendidas (para que assim se garanta um sucesso educativo que não tem de corresponder nem conhecimento nem ao reconhecimento do mérito) não muda nada. A verdade é que sem a aquisição de certos conhecimentos não se pode compreender verdadeiramente os que são ensinados a seguir, na disciplina de Matemática ou noutras.

E agora como é que eu faço?
Como é que eu faço com que o meu filho compreenda que os resultados que ele consegue obter, facilmente, não têm real valor mas são uma fraude do governo para ganhar eleições?
Como é que ele pode compreender - quando convive diariamente com o facilitismo - que escola não lhe exige aquilo que ele devia saber para se preparar, a sério, para o futuro?
Como é que eu lhe explico que os resultados que ele obtém são, na realidade, uma ficção?

ABS disse...

Aos nossos filhos devemos transmitir a seguinte mensagem:

"Defende-te. Não facilites. Aprende tudo o que possas."

Foi o que disse ao meu após ler o comunicado da SPM. Ele fez o teste hoje. Quando lhe perguntei como tinha corrido, a resposta foi "peanuts".

O esforço de preparação dos nossos jovens não foi mal empregue. Dará frutos - e isso terá de lhes ser dito.

Anónimo disse...

Alguém me esclarece sobre os resultados esperados para estes exames? Quero eu dizer, que percentagem vai ter negativa?

Já agora, que percentagem seria desejável?

Pergunto isto porque ouvi diser que, mesmo assim, com todas estas facilidades em ano de eleições, ainda reprovam muitos...

joão boaventura disse...

Sociologicamente, o Ministério, e na sequência do processo de humilhação em humilhação, optou por, na parte final, demonstrar uma vez mais a incapacidade do professorado ao optar pelo facilitismo das provas.

Da inquinação deste processo resulta uma quase passagem administrativa dos alunos, e um quadro estatístico cujos resultados aparentarão honrar o trabalho do Ministério ao longo de um ano lectivo.

E assim se faz a história do desenvolvimento da educação em Portugal, e se adivinha o seu futuro que, como dizia André Malraux, com alguma ênfase,"o futuro é um presente que nos faz o passado".

Anónimo disse...

ABS, o seu filho deveria ter-lhe dito era "piece of cake". Boa sorte para o exame de inglês :)
Não leve a mal, OK?

Anónimo disse...

Então mas... não percebo. Se é este o parecer da Associação de Professores de Matemática, então que raio andaram a ler os senhores do DN?

http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1269723

A ideia com que se fica depois de ler a notícia do DN é que a APM achou a prova "adequada" e tal. Ou seja, nada a ver com a vergonha que é exposta no parecer deste post.

ABS disse...

Caro Anónimo,
Agradeço a correcção e não levo a mal. O miúdo queria dizer que o exame não valia um chavo. Isto em portuglish / SMS speak de adolescente, que não é exactamente inglês isabelino. Nada que não se trate com mais leitura. Um abraço.

Sérgio O. Marques disse...

É sabido que o ensino de matemática no secundário (refiro-me aos anos compreendidos entre o 7º e o 12º) nunca foi grande coisa, pelo menos desde há uma dezena de anos para cá. A maior parte do pessoal já se borrava só de ouvir falar na palavra "teorema". Contudo, a situação actual chega a atingir dimensões assustadoras. Penso que estes moldes vieram para ficar.

Anónimo disse...

NMHO não tem razão nenhuma a SPM que está fora da realidade. 9º ano é a habilitação MINIMA, tal como o foi a antiga 4ª classe. Habilitação para servente de pedreiro, mulher a dias, costureirinha, vendedora de mercado, engraxador.
Tomáramos nós e que grande País este seria se todos estes profissionais citados resolvessem HOJE sem problemas a prova em apreço!

Anónimo disse...

epá...não tem razão nenhuma? Não é por se chumbar no exame de matemática que não se acaba o 9º ano ;)
E, se conseguiu chegar até ao 9º, assume-se que precisa é de ser avaliado nas suas novas competências e não nas antigas porque essas já estão sabidas.

Hoje em dia cada vez mais os professores são pressionados para aprovarem os alunos... Rídiculo :\ não é a nivelar por baixo que o país anda para a frente.

Anónimo disse...

Anónimo 23 Junho 2009 23.55h:

A Sociedade Portuguesa de Matemática não é a Associação de Professores de Matemática...

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